O ministro Barroso quer viver no melhor dos mundos, aquele em que é possível ao mesmo tempo acreditar em direito fundamental e seguir uma ética kantiana. Mas aqui, neste nosso mundinho tão peculiar, onde vige o princípio da contradição, não dá: ou uma coisa ou outra.
Não é possível falar em qualquer coisa de “fundamental” sem supor o conceito de essência ou natureza, aquele conjunto de características que define uma coisa e na ausência do qual, ela não poderia existir. Logo, podemos dizer que o que é fundamental preexiste à própria coisa.
Como chega o homem a definir a natureza das coisas? Pela observação e abstração dessas características. Todos os gatos são gatos, a despeito da sua cor, do seu tamanho, da sua raça porque conhecemos o que é o essencial de um gato. A natureza das coisas está nas coisas mesmas e o homem não faz mais do que reconhecê-las para daí dizer: isto é uma casa, isto é um cavalo, isto é um ministro. Custa-nos por isso imaginar uma casa sem paredes, um cavalo sem quatro patas, um ministro sem toga.
Mas ocorre que o ministro se diz um kantiano. E para um kantiano não existe natureza ou essência das coisas. Ou pior: se existe ou não existe não temos como sabê-lo, porque a coisa em si nos é – ou nos seria – inacessível. Então como poderíamos sequer postular essa inacessibilidade? Kant não explica. E isso que atribuímos às coisas como essência só existe na nossa cachola. Kant era o Simão Bacamarte de Konigsberg.
Mas se não há de fato essência, nada há também que se possa dizer “fundamental”. A “natureza” quem acrescenta às coisas somos nós que delas não deveríamos falar nada. Ou podemos falar o que quisermos. Tanto faz. Mas vê-se que o ministro escolheu a segunda opção.
Voltaremos a esse problema em outros posts. Por ora, fixemos a primeira lição: This is a book.