A misericórdia é vermelha

Não bastava a recepção sorridente do “crucifixo” em foice e martelo, das mãos de Evo Morales; não bastou ter se encontrado com o radical-democrata Bernie Sanders (o Evo Morales norte-americano) em plenas eleições presidenciais, ou ter entregado os católicos chineses às garras dos comunistas de Pequim; eram pouco as demonstrações de simpatia e as mensagens afetuosas distribuídas, com singular benevolência, a “teólogos” da “libertação” como Boff, Gutiérrez e Frei Beto, ou a tristes figuras políticas como Lula da Silva, Dilma Roussef, Daniel Ortega, Cristina Kirchner e Nicolás Maduro.

Sequer bastavam as duas visitas a Cuba (único país a receber a dupla honraria), nas quais foi mediador da retomada das relações diplomáticas entre a ilha-prisão e os Estados Unidos da América. Era preciso que se afirmasse com todas as letras, sem possível pretexto de se tratar de uma mera concessão diplomática, a especial predileção do Papa Francisco pela ideologia comunista e pelos regimes que nela se baseiam.

Pois o Vigário de Nosso Senhor, o Doce Cristo na Terra, o Chefe visível da Esposa, resolveu celebrar em Roma, na Cidade Eterna, no último 1º de janeiro… não o Ano Novo, mas… o sessentenário da revolução cubana, por meio da qual um dos países mais prósperos da América Latina foi seqüestrado por uma camarilha que o mantém, desde então, sob a égide do “comunismo intrinsecamente perverso”, com o qual “não se pode admitir colaboração em campo algum, da parte de quem quer que deseje salvar a civilização cristã” (Pio XI, Divini Redemptoris, nº 58).

Guardemos bem essas graves palavras de Pio XI, e consideremos agora as palavras da Roma modernista, Sé universal da Outra, estampadas no seu sítio de notícias oficial: trata-se do “histórico aniversário” da revolução; refere-se a Fidel Castro “entre os principais próceres nacionais”; alude-se aos tiranos comunistas sempre como “presidente”, “chefe de Estado”, “líder do Partido comunista”, enquanto Fulgêncio Batista, o governante deposto em 1959, é fustigado como “ditador”; o discurso de Raúl Castro (extenso, diz a matéria, num fugidio descuido de objetividade) é reproduzido em clave laudatória. No topo da matéria, a fotografia de um sorridente Francisco em meio a artistas circenses cubanos, cuja exibição se articulava com as celebrações do “histórico aniversário”.

Entretanto, é no último parágrafo que fica a mais cândida confissão: sob o título “a revolução da misericórdia do Papa”, as três linhas finais deixam bem claro que, enquanto o Concílio Vaticano II foi o 1789 na Igreja, o pontificado atual se esforça para ser o outubro de 1917 ― não o do Milagre do Sol em Fátima, mas o das convulsões nas ruas de Petrogrado ― e talvez, quem sabe?, o maio de 1968.